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Carlos Alberto Mattos

Crítico, curador e pesquisador de cinema. Publica também no blog carmattos

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Cinema: Infância e esperança no Alemão

Filme forte e comovente ao reunir a infância e a arte como antídotos à realidade dura de uma cidade que há muito deixou de ser maravilhosa

(Foto: Divulgação)

O tema da violência policial e das carências nas comunidades do Rio de Janeiro tem sido frequente em documentários. De tal forma que fica cada vez mais difícil encontrar um viés menos batido para se abordar o assunto. Isso só faz aumentar os méritos de Theresa Jessouroun em Direito de Sonhar, já premiado nos Impact Awards (EUA) e no Africa Human Rights Film Festival (África do Sul). 

Theresa não se furta a ouvir moradores do Complexo do Alemão, um gigantesco conjunto de favelas na Zona Note do Rio, sobre as batidas policiais desastrosas, o risco permanente dos tiroteios e a falta de água, luz, saneamento básico e internet em grandes porções do Complexo. Desde que as iniciativas de melhoria tomadas nos governos Lula e Sérgio Cabral foram descontinuadas – a exemplo do teleférico que se tornou até ponto turístico e hoje se encontra inoperante e arruinado –, o crime organizado retomou o controle do lugar, e as condições de vida se degradaram ainda mais. O estado só se apresenta através da criminalização e da violência. 

Cineasta de forte engajamento social e herdeira de Eduardo Coutinho na forma de abordar seus entrevistados, Theresa Jessouroun direcionou seu olhar dessa vez para a infância e a adolescência afetadas pela atmosfera de medo e a falta de oportunidades. Desde a abertura do documentário, com o funeral da menina Ágatha Félix, de oito anos, morta por um policial em 2019, o foco não se afasta, direta ou indiretamente, de meninos e meninas do Complexo. 

Mães (em geral solos) choram a perda de filhos e o temor de perder ainda outros pelas balas supostamente perdidas nos tiroteios. Crianças comentam com olhos tristes o medo dos tiros e a precoce convivência com a morte. A consciência de algumas quanto às desigualdades que enfrentam chega a ser surpreendente. Ao mesmo tempo, a pandemia de Covid-19 tornava tudo um tanto mais dramático. 

Mas Direito de Sonhar vai buscar um contraponto para o drama do Alemão nas várias iniciativas particulares voltadas para a educação de crianças e jovens. A Creche Estrelinha, por exemplo, que supre a ausência dos pais nas horas de trabalho. A Oca dos Curumins da Tia Bete, escolinha de arte para os miúdos e de alfabetização para adultos. A ONG Educap, a escola de balé Vidançar, a escolinha de futebol Bom de Bola, Bom de Escola. A ausência do estado vai sendo remediada por pessoas devotadas que tocam essas pequenas organizações e pelos usuários que compreendem o valor da educação e da cultura como passaportes para uma vida melhor. 

Outra camada de boas energias vem de artistas do Alemão que trazem seu talento para dentro do filme. MC Martina com seus versos cheios de lucidez; Bielzinho com seu rap papo reto. Nara Batista com seu discurso clarividente e seus sambas extrovertidos que lembram uma Alcione ainda por ser consagrada.

Direito de Sonhar termina por ser um filme forte e comovente ao reunir a infância e a arte como antídotos à realidade dura de uma cidade que há muito deixou de ser maravilhosa. 

>> Direito de Sonhar está nas plataformas Claro TV+ (NOW), Vivo Play e Oi Play.

O trailer:

https://vimeo.com/704718412

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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