Quem é o juiz federal que ajudou Moro no processo que transformou Tony Garcia em agente infiltrado
Depois de Gabriela Hardt, surge outro nome na Justiça Federal em Curitiba que ajudou Moro a construir sua teia de poder
Uma das perguntas que precisam ser respondidas para que não se repita no Brasil o que muitos juristas consideram o maior erro judicial da história é como Sergio Moro acumulou poder enquanto era juiz de primeira instância em Curitiba.
No documentário que estamos realizando, "Um juiz fora da lei - Os crimes de Moro e a Máfia de Curitiba", essa é uma das questões centrais, e algumas pistas já apareceram.
Uma delas é o processo que levou o empresário e político Antônio Celso Garcia, o Tony, a se tornar agente infiltrado e a cometer crimes em série, como ele próprio confessa.
Para responder a essa pergunta, é preciso retroceder a 1994, quando o Banco Central decretou intervenção no consórcio Garibaldi, que tinha sede em Curitiba e era um dos maiores do Brasil.
Na época, Moro era estudante de Direito na Universidade Estadual de Maringá e estagiava no escritório de advocacia do tributarista Irivaldo Joaquim de Souza, que mais tarde responderia a uma ação civil pública por ser contratado pela prefeitura de Maringá sem licitação.
Moro assume como juiz federal em 1996, após concurso público, e começa sua carreira como substituto na capital paranaense. Quando era juiz, prestou depoimento a favor de Irivaldo na ação civil pública e elogiou o antigo patrão pelo "prestígio" na área tributária.
Quando o Garibaldi sofreu intervenção, um dos advogados do consórcio era Danilo Pereira Júnior, que, mais tarde, também seria juiz federal e trabalharia no mesmo Fórum em Curitiba.
Moro retoma a ação do consórcio Garibaldi em 2003, quando Tony Garcia deixa o mandato de deputado estadual no Paraná e após perder a eleição para o Senado.
Para avançar no processo contra Tony, Moro faz um acordo de delação premiada com o antigo administrador do consórcio, Agostinho de Souza.
Na época, não havia lei que regulamentasse acordos dessa natureza, mas Moro, mesmo assim, usava a prática, em larga escala. Agostinho disse que Tony era o verdadeiro dono do consórcio e, respondendo a uma pergunta de Moro, afirmou que temia pela sua vida, pois Tony e um sócio "trabalham com marginais, agem como como marginais" e o chamou de "bandido".
Foi o suficiente para que Moro enviasse um ofício para o Superior Tribunal de Justiça, em que defendia a revogação de uma liminar em habeas corpus (HC) que proibia a Vara de Moro de investigar Tony Garcia.
Entre os argumentos de Moro para derrubar o HC, estava o risco da prova ser perdida, insinuando que Agostinho Pereira poderia ser assassinado por Tony Garcia.
A atitude de Moro é incomum para um juiz, possivelmente ilegal, já que ele se portava como parte em uma ação, e não magistrado.
Mas o mais grave é como Moro obteve o depoimento de Agostinho de Souza, que não era verdadeiro, como o próprio delator reconheceria mais tarde, em uma ação por danos morais movida por Tony Garcia.
Nessa ação por danos morais, Agostinho admitiu que nunca foi ameaçado por ele e que o chamou de "bandido", por conta do "momento de bastante nervosismo, sendo exasperadas (as falas) e fruto do momento de fragilidade processual".
Segundo Agostinho admitiu, em outro depoimento, quem o levou para fazer o acordo de delação premiada foi Danilo Pereira Júnior. Um absurdo completo, já que Danilo era juiz federal e não tinha nenhuma jurisdição no caso.
Mas por que, então, Danilo se envolveu no processo e convenceu Agostinho a prestar depoimento a Moro?
A resposta pode estar no fato de que a esposa do juiz, Mauritânia Bogus, aparecia na relação do Banco Central como possível beneficiária de fraude no consórcio Garibaldi.
Apesar disso, ao contrário das outras pessoas que aparecem na lista, Mauritânia não foi sequer intimada a prestar depoimento. Em junho de 2005, durante novo depoimento de Agostinho, o advogado de Tony Garcia perguntou se ele conhecia Mauritânia.
Agostinho respondeu que era a esposa de Danilo, na época funcionário do grupo, e que ela havia sido contemplada com um bem do consórcio como parte de um "acerto final do mesmo esquema que foi feito com os outros funcionários do grupo".
Ou seja, como registrou o Banco Central, houve fraude na seleção dos consorciados contemplados, para acertos trabalhistas que nada tinham a ver com as regras do consórcio.
Danilo prestou depoimento como testemunha no processo, em carta precatória cumprida por um juiz federal de Londrina, sobre outro caso de suposta fraude no Garibaldi, muito parecido com o dele, mas nada foi perguntado sobre a esposa.
Moro pode ter chantageado o colega para conseguir seus serviços numa articulação para prender Tony Garcia e transformar o empresário em agente infiltrado?
Fiz a pergunta ao próprio juiz Danilo Pereira de Souza, por meio da assessoria de imprensa do Tribunal Regional Federal da 4a. Região (TRF-4), onde Danilo trabalhou como juiz auxiliar convocado, mas ele não respondeu.
Perguntei também por que ele não se declarou impedido recentemente, quando um recurso de Tony Garcia contra decisão de Gabriela Hardt foi distribuído para ele no TRF-4. Danilo também silenciou.
Tony Garcia contestava a decisão de Gabriela Hardt de revogar o ato de Eduardo Appio, que é juiz titular da 13a. Vara Federal de Curitiba e foi afastado. Appio havia encaminhado para o STF a denúncia de Tony Garcia sobre os aparentes crimes de Sergio Moro, cometidos a partir do caso do consórcio Garibaldi.
Os advogados de Tony pediram liminar, mas Danilo não tomou nenhuma decisão até que o ministro Dias Toffoli decidiu que os processos envolvendo o ex-agente infiltrado de Moro deveriam ser remetidos a ele.
A sujeira do ex-juiz da Lava Jato não contaminou apenas a 13a. Vara Federal de Curitiba. A teia é muito maior e, em nome da recuperação da credibilidade da Justiça Federal no sul do país, é preciso responsabilizar um a um os agentes públicos que ajudaram Moro a se tornar o juiz todo-poderoso, que sequestrou as instituições brasileiras com métodos típicos da máfia.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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