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Milton Alves

Jornalista e sociólogo

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A volta do Programa Mais Médicos e o desafio do fortalecimento do SUS

"A permanência da ministra Nísia Trindade na pasta da Saúde é a garantia do compromisso com o SUS", escreve o colunista Milton Alves

Rosângela da Silva, Nísia Trindade, Luiz Inácio Lula da Silva e Lu Alckmin (Foto: Ricardo Stuckert)

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou, na sexta-feira (14), em Brasília, a volta do Programa Novo Mais Médicos. Trata-se da retomada de um programa que foi esvaziado e desfigurado pelo golpe de 2016 contra o mandato da presidenta Dilma Rousseff.

O programa, aplicado com êxito e que teve amplo apoio da população mais pobre, foi demonizado pelas forças políticas de direita e por entidades de representação da categoria médica, principalmente, dos conselhos nacional e estaduais (CRMs), que orquestraram uma campanha virulenta e preconceituosa contra o ‘Mais Médicos’, implantado no início do segundo mandato da Dilma. O alvo para tentar minar a execução do programa foi a presença dos médicos cubanos

A nova versão Programa Mais Médicos prioriza os médicos brasileiros registrados no país. O primeiro chamamento, de 5.970 vagas, recebeu mais de 34 mil inscritos, número recorde desde o lançamento em 2013. Antes, a maior marca havia sido registrada em 2015, com 18.240 médicos ativos no programa. O edital anunciado pretende, até o final do ano, o ingresso de mais 28 mil médicos no Mais Médicos.

O programa, além de atender as periferias das áreas metropolitanas e do interior mais pobre do país, terá um foco concentrado de ação nos territórios indígenas, quilombolas e ribeirinhos. A projeção é que o programa garanta o atendimento de mais de 96 milhões de brasileiros nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) — porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS),

“Nesse momento, o foco está em garantir a presença de médicos brasileiros no Mais Médicos, um incentivo aos profissionais do nosso país. Se não houver quantitativo, teremos a opção de médicos brasileiros formados no exterior. E, se ainda assim não tivermos os profissionais, optaremos por médicos estrangeiros. O nosso objetivo não é saber a nacionalidade do médico, mas a nacionalidade do paciente, que é um brasileiro que precisa de saúde”, afirmou o presidente Lula durante a solenidade de anúncio do Novo Mais Médicos.

A nova versão do programa adotou também um conjunto de mecanismos de incentivos para assegurar a permanência dos profissionais nas áreas mais afastadas e de difícil acesso, com isso, tratando de evitar o risco da desistência.

Defender o legado e fortalecer o SUS Nos últimos anos, o SUS enfrentou enormes desafios e uma hostilidade criminosa do governo neoliberal de Bolsonaro, que chegou até a militarizar o Ministério da Saúde durante a pandemia de Covid-19.

O grande ataque ao financiamento do SUS aconteceu já em 2016, quando da aprovação pelo governo golpista da emenda constitucional 95, conhecida também como a PEC da Morte (PEC 241/2016) -, que limitou os investimentos em políticas sociais por vinte anos. O Arcabouço Fiscal, novo nome fantasia para o famigerado “teto dos gastos”, é um fator de risco para o financiamento do SUS, segundo a opinião de diversos especialistas.

O SUS é uma grande invenção do nosso povo e um dos maiores arranjos institucionais do estado brasileiro, incorporando, com criatividade e eficiência, as melhores experiências mundiais na adoção de um sistema universalizante e público de saúde. É verdade que há muitos desafios e insuficiências, mas sem o SUS o país ficaria completamente à mercê dos mercadores e capitalistas da saúde.

O SUS opera com o sistema de “porta de entrada” como o Serviço Nacional de Saúde (National Health Services – NHS) da Inglaterra com atendimento médico em todos os níveis -, desde as unidades locais básicas até aos cuidados hospitalares de alta complexidade e cuidado intensivo.

Nesses mais de 30 anos segue de pé a luta pela manutenção do princípio fundante do SUS: “A Saúde como um direito de todos e um dever do estado”. Para avançar na consolidação do SUS é decisivo enfrentar a questão do financiamento. Ou seja, expandir a alocação de recursos no sistema. Somente dessa forma vamos garantir a continuidade de importantes políticas e vencer os novos desafios no sentido de assegurar uma cobertura universal.

São alguns pontos de tensão e gargalos no curto e médio prazo para o SUS:

  • Garantir uma efetiva integração dos entes federados e maior investimento na capacidade de gestão das Unidades Básicas de Saúde, UPAs e nas redes de hospitais municipais e estaduais;
  • Fortalecimento e a requalificação da rede de hospitais federais;
  • Estabelecer marcos regulatórios para a avaliação dos serviços públicos de saúde;
  • Garantir o controle social do sistema com a retomada das conferências nacionais, estaduais e municipais de saúde;
  • Fortalecer os conselhos de saúde em todos os níveis;
  • Promover campanhas sistemáticas de valorização da carreira dos profissionais de saúde – melhores salários e planos de carreira;
  • Requalificar o programa nacional de vacinação;
  • Unificar nacionalmente o legado e a experiência de combate ao novo coronavírus para criar uma sistema de enfrentamento de pandemias e surtos localizados de doenças como dengue, sarampo, tuberculose, doenças tropicais e gripes sazonais.

A força do SUS reside também no amplo acúmulo de uma rede diversificada de profissionais, gestores e especialistas comprometidos com uma visão humanista na defesa de uma saúde pública inclusiva e de qualidade.

A permanência da ministra Nísia Trindade na pasta da Saúde é a garantia do compromisso com o SUS. A declaração do presidente Lula garantindo o apoio presidencial para Nísia afasta as maquinações do Centrão de Arthur Lira e do lobby do baronato da medicina privada, que se articula para disputar os recursos e que tentou capturar a direção do Ministério da Saúde.

Uma nota pessoal: Em 2013, no auge da campanha contra o ‘Programa Mais Médicos’, critiquei a conduta dos médicos em artigo no meu blog pessoal, que faziam uma agressiva campanha contra o governo e a implantação do programa. Uma ação de médicos curitibanos, impulsionada pelo Simepar – Sindicato dos Médicos do Paraná -, resultou na minha condenação, em abril de 2018, mesmo após recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ), por calúnia e danos morais – com multa de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) e a perda da condição de primariedade. A retomada do ‘Novo Mais Médicos’ é uma vitória do povo brasileiro.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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